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| Martinho Lutero | 
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ECCLESIA REFORMATA ET SEMPER REFORMANDA EST
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Rev. Ramacés Hartwig, ost (*)
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     A chamada REFORMA PROTESTANTE DO SÉCULO XVI,  cuja data comemora-se em 31 de outubro, precisa ser compreendida no  conjunto das demais reformas ocorridas ou em efervescência naquele  período histórico da Idade Média, pois, ela aconteceu no contexto  europeu de muitos questionamentos religiosos e de grandes descobertas  científicas que mudaram o rumo das ciências e diversificaram o  entendimento da fé cristã. Além disso, esta “reforma religiosa” não  aconteceu de um momento para o outro; não é o resultado de um protesto  localizado e não foi fruto só de uma cabeça, ou seja, a Reforma Protestante foi resultado de um longo processo de “reforminhas”  que, com o passar de meses (ou até anos) foi tomando corpo e  encontrando ressonância em outras cabeças em diferentes lugares, porém,  tendo em comum os mesmos anseios e necessidades: reformar, mudar, voltar  às raízes ou, resumindo, retornar às origens da fé cristã!
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      A expressão (em latim) em epígrafe quer significar IGREJA REFORMADA  SEMPRE REFORMANDA, ou seja, “a Igreja deve estar em contínuo processo de  atualização e contextualização da mensagem cristã” para enfrentar os  desafios do mundo contemporâneo e os dilemas do ser humano moderno. Sua  autoria é atribuída a um teólogo holandês chamado Gisbertus Voetius  (1589-1676), e foi elaborada no contexto das ardentes discussões do  Sínodo de Dort (1618-1619), realizado pela Igreja Reformada Holandesa  (na cidade de Dordrecht). Esta assembleia sinodal também tratou de se  contrapor à grave influência do arminismo (Jacobus Arminius  (1560-160) teólogo holandês) cuja afirmação central era que a “dignidade  humana requer a liberdade total e perfeita do arbítrio humano” (da  livre escolha). 
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| A igreja de Wittenberg hoje | 
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      Em 1514, o padre Martinho Lutero (com 31 anos) assume a igreja de  Wittenberg. Durante seu trabalho pastoral constata que muitos dos  cidadãos preferem comprar “cartas de indulgência” a confessar-se com  ele. Essas indulgências eram vendidas nas feiras livres com o objetivo  de angariar fundos para a construção da Basílica de São Pedro (em Roma).  Conta-se que o monge dominicano Johann Tetzel (representante do  Arcebispo de Mains e do Papa) anunciava: "Quando o dinheiro cair na  caixinha, o Céu estará recebendo a sua alminha".
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     Neste contexto histórico-religioso, relatam historiadores entre muitas controvérsias, que no dia 31 de outubro de 1517  o monge agostiniano e professor de teologia Martinho Lutero  (1483-1546), com sonoras marteladas, afixou na porta da igreja do  Castelo de Wittenberg suas 95 teses contrapondo-se aos  ensinamentos da Igreja (católica romana) quanto à natureza da  penitência, a autoridade do papa e a (in) utilidade das indulgências.  Suas teses logo são impressas e distribuídas em Leipzig, Nurenberg e  Basiléia. O documento da indulgência garantia ao cristão que praticou  esta boa ação (financeira), a garantia do perdão de Deus (indulto) e,  por conseguinte, não precisava mais confessar seus pecados, pois, os  mesmos já haviam sido perdoados pelo Papa.
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      Em 1518 Roma abre um processo por heresia contra Lutero e, dois anos  mais tarde, o Papa Leão X ameaça puni-lo caso não revogue suas teses. Ao  receber severas advertências e ameaçado de excomunhão, no dia 10 de  dezembro de 1520, o “monge rebelde” queima a bula papal (em praça  pública) em explícito protesto contra Roma, além de um livro de leis  católicas e várias obras de seus opositores. Quando o Papa fica sabendo  deste escandaloso espetáculo da incineração de sua bula lança sobre  Lutero a maldição da excomunhão no dia 03 de janeiro de 1521.  Aproveitando-se do momento, o pregador e vendedor das indulgências, seu  irmão de ordem Tetzel, pede a fogueira para o “monge rebelde”.
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| Representção da corte de Worms | 
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      Entretanto, alguns príncipes colocam-se do lado de Lutero e, crendo que  através dele será possível limitar o poder de Roma, convencem o  imperador a convidá-lo para ir defender suas ideias perante a corte  imperial em Worms. Em abril de 1521 Lutero põe-se a caminho e, ao  contrário do que desejava Roma, é recebido com entusiasmo durante todo o  trajeto. Ele prega em Erfurt, Gotha e Eisenach antes de ser aclamado  pelos cidadãos de Worms. Com o agravamento do caso o Imperador Carlos V  desejava possibilitar que Lutero se retratasse a fim de amenizar a crise  com Roma e, para tanto, convocou a Dieta de Worms (realizada na cidade  do mesmo nome entre 28 de janeiro e 25 de maio de 1521). Não foi o que  aconteceu. Nesta ocasião foi-lhe perguntado: "Lutero, repeles teus livros e os erros que eles contêm? ao que ele respondeu:
- Que  se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos  da razão, porque não acredito nem no Papa nem nos concílios já que está  provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos - pelos  textos da Sagrada Escritura que citei, estou submetido à minha  consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero  retratar-me de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro  nem saudável."  
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      Nos dias seguintes ocorreram muitas conferências privadas para  determinar qual o destino de Lutero e, antes que a decisão final fosse  tomada, Lutero abandonou a Dieta. Durante seu regresso a Wittenberg ele  desapareceu e o Imperador, no Edito de Worms (em 25\05\1521), declarou  Martinho Lutero fugitivo e herege. Durante a viagem de volta, a firmeza  de caráter do reformador é recompensada: o príncipe-eleito da Saxônia,  Frederico, o Sábio, manda sequestrá-lo, conferindo-lhe guarida e  proteção no isolado castelo de Wartburg onde o ex-monge começa sua  grandiosa empreitada, ou seja, traduzir a Bíblia do latim (língua  eclesiástica) para o alemão (vernáculo local).
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      Por outro lado, Lutero foi apoiado por vários religiosos e governantes  europeus provocando uma “revolução religiosa” (mundial) que começou na  Alemanha e se estendeu pela Suíça, França, Países Baixos, Reino Unido,  Escandinávia e algumas partes do Leste europeu, principalmente nos  Países Bálticos e na Hungria. A resposta da Igreja Católica Romana foi o  movimento conhecido como Contra-Reforma (ou Reforma Católica) iniciada  no Concílio de Trento (convocado pelo Papa Paulo III e realizado entre  1545-1563). Este foi o concílio ecumênico (no sentido universal) mais  longo da história da Igreja Católica e também o que emitiu o maior  número de decretos dogmáticos e reformas, além de produzir resultados  mais benéficos, duradouros e profundos sobre a fé e a disciplina na  Igreja de Roma.
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| Catarina von Bora | 
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      Em minha opinião, a maior contribuição de Lutero foi sua coragem e  audácia em traduzir a Bíblia tornando-a não só um livro acessível como  compreensível ao povo. Consequentemente, isso causou um grande impacto  não só na Igreja alemã, como também na liturgia (na missa\culto) e na  teologia cristã. Desse fato redundou o desenvolvimento de uma versão  padrão da língua alemã que, além de adicionar vários princípios à arte  de traduzir, favoreceu e influenciou a tradução para o inglês na versão  popularmente conhecida como King James.  Além disso, os hinos de Lutero também influenciaram o desenvolvimento  do ato de cantar em igrejas, pois, isto era reservado aos monges. Por  fim, seu casamento com Catarina von Bora (resultando em sete filhos)  estabeleceu um modelo para a prática do casamento clerical, permitindo o  santo matrimônio de “padres protestantes”.
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Pelotas, 30\10\2011, ad.
Rev. Ramacés Hartwig, ost
Bageense de “três costados!”
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(*) Natural de Santa Catarina, Ramacés Hartwig - que foi pastor da Igreja Anglicana de Bagé  durante vários anos, reside hoje na Colônia Santa Helena, no 8º  distrito de Pelotas, onde é pároco da  área rural. Ramacés fez   doutorado, na cidade de Genebra, Suíça, quando  foi aluno do Cardeal  Ratzinger, hoje Papa Bento XVI. Sua tese foi sobre Ministérios,  Ecumenismo e Diálogo Interreligioso, concluída, depois, em Jerusalém.
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Publicado em www.velhaguardacarloskluwe.blogspot.com.
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Um comentário:
Texto claro e limpo. Objetivo. Didático ao extremo. Coisa de um legítimo "doutor". (Dizem que só os doutores é que conseguem se expressar com simplicidade....) Parabéns ao Blog por publicar um material tão bom - e apropriado para os dias de hoje - falando sobre um assunto bem (des)conhecido.
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